quinta-feira, 27 de abril de 2006

Black Mountain - s/t (2005)



Sabe quando você se depara com aquele disco repleto de informação e, de saída, não consegue sacar a banda da forma mais preguiçosa? Sabe quando ouve algumas vezes e fica na dúvida se os caras estão perdidos no excesso de referências ou se condensaram tudo maliciosamente em 40 e poucos minutos, justamente com a intenção de primeiro te oferecer um balaio de iguarias que você já provou antes mas que, recombinadas com alguma criatividade e persistência, proporcionam um novo prazer? Pois em algum lugar nessa larga avenida de divagações está espalhada a música do Black Mountain, que estreou com um belo álbum homônimo no ano passado e só agora descobri.

Existem, basicamente, duas formas de se escutar o disco deste coletivo de Vancouver (Canadá) que gira em torno de Stephen McBean. A primeira, mais fácil e lúdica, faz você ir associando cada passagem a algum momento relevante já percorrido por esse cinquentão enrugado (err... o rock, não o tal do McBean). Está tudo lá, muito bem distribuido: Velvet, Black Sabbath, Stones, Pink Floyd, space rock, Led Zeppelin, Sly & The Family Stone, stoner rock, The Fall, estética low fi. "Modern Music", por exemplo, abre o disco com um sax aparvalhado e lembra Pavement pelo desleixo cínico e divertido, mas serve como pista falsa para o que vem a seguir. O single "Druganaut" é um híbrido do groove lisérgico do Sly Stone com o peso monolítico do Sabbath. Bagagem referencial transbordando. E olha que são apenas duas das oito faixas.

Há ainda uma segunda form(ul)a para ouvir Black Mountain. Para isto, no entanto, antes de mais nada seria preciso descartar o parágrafo anterior. É uma experiência de retorno menos imediatista e mais recompensador: esqueça quem já fez parecido antes, fique com as pistas inadvertidamente cedidas. É mais simples do que parece. Basta prestar atenção nas flautas, vocais masculinos/femininos, palmas, pandeiros, atmosferas drogadictas. Nevoeiro. Introspecção. Euforia descontraída. Confusão. Sujeira bem organizada. E fique tranqüilo, pois acaba antes de cansar e você provavelmente vai descobrir mais detalhes e lugares nas próximas audições.

Stephen McBean pode ter uma baita cara de zé droguinha, mas é um sujeito inquieto. Também já confabulou outros projetos, como o Jerk With A Bomb e o Pink Mountaintops - este último soltou recentemente o álbum Axis Of Evol. Tem lançado em média um disco por ano, cada vez por uma das bandas e sempre por um selo próprio, o obscuro Jagjaguwar. A crítica e o bom nerd de plantão prestam mais atenção a cada lançamento do coletivo. Ouvi uma ou outra coisa e, nesse mostruário de tubos de ensaios, o Black Mountain parece ser o mais convidativo capítulo iminente para o que realmente interessa.

sábado, 22 de abril de 2006

The Raconteurs - Broken Boy Soldiers (2006)



Sou daqueles que torcem o nariz quase de imediato a hypes do novo roquismo, apesar de acompanhar uma ou outra banda à distância. Os critérios que vou usando para ir atrás ou descartar o que a mídia especializada anda babando o ovo são um tanto incoerentes e obscuros. Enquanto não chega o momento em que alguém dessa 'leva dos anos 00' transcenda à perenidade - por meio de trabalhos mais consistentes ou pelo bom 'envelhecimento' dos já lançados - vou me guiando por este faro subjetivo. Mas isso não importa agora.

O que interessa como prólogo à audição de Broken Boy Soldiers é: o White Stripes, banda que divide Jack White com os estreantes Raconteurs, nunca me desceu direito. Ok, o cara tem algum talento, saca um bocado de guitarra e de autopromoção, mas sua banda sempre me soou ordinária, comum. Voz entre o esganiçado e o histérico, blues sujo e garageiro como dezenas de bandas americanas já fizeram com igual ou maior competência, e alguma habilidade para compor músicas marcantes (subutilizada em "Seven Nation Army", o hit mais chato de 2003). Sem contar as excentricidades da dupla sempre prevalecendo à música, o que depõe muito contra. E Brendan Benson, o outro membro 'manjado' dos Raconteurs? O pouco que conhecia remetia a um Elliott Smith mais dado a amenidades. Só confirmava minha baixa expectativa para esse projeto.

O disco, no entanto, quase consegue a proeza de unir o melhor dos dois mundos. A começar pela música de trabalho, "Steady, As She Goes", a primeira a cair na internet: um power pop caprichado, que valoriza os backing vocals e com guitarras moldando um senso melódico na escola do Big Star (banda setentista lendária, mas com pouco reconhecimento de público). Muito do material que a segue vai por um caminho parecido. A faixa-título, "Intimate Secretary" e "Store Bought Stones" são exemplos de como a banda emula impiedosamente Led Zeppelin nos agudos de Jack White, nas slide guitars, nos riffs inventivos, nos arranjos que crescem com ajuda de violões folk e de uma cozinha pesada. Os anos 70, e em especial as duas bandas daquela década citadas aqui, emprestam as principais ferramentas dos Raconteurs.

E não pára por aí. "Yellow Sun" lembra a introdução de "Pinball Wizard", do Who. A faixa que encerra o disco, "Blue Veins", entrega ainda mais: dá pra imaginar Jack White ouvindo sem parar "Since I've Been Loving You", aquele épico blues rock zeppeliano, enquanto a compunha. Ou quem sabe a fonte tenha sido "I Want You", o momento mais dilacerado de John Lennon em Abbey Road. No meio disso tem a balada "Together", talvez a principal composição de Benson no disco, acenando tanto para essa atual onda neo-folk como para os caipiras originais dos anos 60 e 70.

Broken Boy Soldiers é, sim, um álbum bem retrô. O elemento diferencial que os joga de volta ao presente - livrando a cara deles da suposta acusação de 'nostalgia do não-vivido' - está no simples poder de concisão, típico do rock feito nesta década. Nada sobra nas dez faixas, tudo é bem dosado e pouco reafirma os excessos do rock de arena ao qual boa parte do hard rock dos 70's descambou antes do punk surgir.

Ah, e eu disse que há QUASE o melhor dos dois mundos de JW e BB? Deve ser porque eles mal se juntaram e ainda estão no caminho... e tudo bem, o primeiro dos White Stripes até que é bacana.

quinta-feira, 13 de abril de 2006

Começando a cumprir a previsão de hoje mais cedo, passo a comentar aqui os discos que rodam aqui em casa. Tentando deixar a pretensão de lado, é claro. E falando nisso...

Snow Patrol - Eyes Open (2006)



Quase todos os textos que li sobre o Snow Patrol - especialmente os que saíram após o lançamento do bem sucedido disco anterior, Final Straw (2004) - comparavam esses escoceses ao Coldplay, como se fossem tudo aquilo que faltava à burocracia de Chris Martin e seus colegas: mais vibração, menos pieguismo. Melodias igualmente bem acabadas porém mais sucintas, com uma pegada mais roqueira.

Bem, confesso que ofereci alguma resistência à banda, pois costumo manter distância do tédio que o Coldplay e bandas relacionadas (er... Keane?) me despertam. Já havia conferido rapidamente o primeiro disco da patrulha da neve, Songs For Polarbears, que me causou total indiferença. Algo do tipo: ok, mais um bando de jovens sensíveis para fazer volume na segunda divisão do indie pop britânico, que também não anda lá bem das pernas. No entanto, fui cedendo aos poucos, peguei o disco de 2004 para escutar e, movido por canções altamente grudentas como "Spitting Games", acabei endossando aquelas resenhas.

Já este Eyes Open, quarto CD do Snow Patrol (ainda não disponível nas lojas), depura todas as qualidades e mantém os excessos de Final Straw. Se no disco anterior haviam guitarras altas palhetadas para baixo somadas ou se alternando a teclados onipresentes, agora a banda mantém a equação, com produção e timbres ainda mais esmerados. Se antes faziam baladas cinicamente desamparadas para ganhar os fãs pueris dos Smiths, dessa vez ainda colocam uns backing vocals femininos. Soam como uma banda de garagem sendo obrigada a tocar em uma arena para um público médio, tentando conquistá-lo com canções redondas, cheias de refrões grudentos, mas ao mesmo tempo enxutas de clichês popularescos.

As três faixas que abrem o disco, "You're All I Have", "Hands Open" e "Chasing Cars" são extremamente acessíveis e radiofônicas mas fogem do vazio e da desmedida. Suas letras são simples sem serem derramadas. Em "It's Beginning To Get Me" o vocalista Gary Lightbody arrisca um falsete a la Bono e (medo!) Chris Martin, mas a superação da honestidade sobre a canastrice acaba conquistando o ouvinte. A rapidinha e alegre "Headlights On Dark Roads" joga um balde de água fria nessa faceta 'eloqüente', com a guitarra lembrando Pixies.

Se você cansou da nerdice rock de buscar os 30 discos mais experimentais segundo a Mojo, se quer ouvir música pop não vulgar em 2006 e está disposto a dar ouvidos a uma banda sem pretensões vanguardistas/messiânicas/salvadoras do rock, abaixe a sombrancelha desconfiada e arrume um jeito de ouvir este disco.