sábado, 14 de novembro de 2009

Interlúdio

Tive um sonho quase kubrickeano essa semana. Era como se uma espécie de nave espacial voasse durante horas pelo céu da Terra, mas apesar de meu campo de visão ser o de quem está dentro dela, eu observava de um lugar à parte. Um recinto tão escuro e direcionado quanto uma sala de cinema, mas sem poltronas, cheiro de pipoca amanteigada e gente sem educação no celular. De um enorme painel transparente dianteiro dava para ver o que passava lá embaixo, uma mistura de paisagem rural e urbana: pastos, árvores agrupadas, vegetação e rios, mas também prédios, carros e avenidas. Não me lembro de ver pessoas. A embarcação voadora também não tinha nenhum equipamento para controlá-la e se resumia a um salão vazio e amplo, com paredes de aço e chão cheio de círculos de vidro por onde também dava para contemplar o panorama externo.
Para complementar, mais dois detalhes bizarros. Primeiro: apesar de ter certeza de que estava sobrevoando a Terra, a maior parte da paisagem fora da nave, com exceção de alguns detalhes, tinha cores parecidas - marrons, avermelhadas, cor de terra e poeira. Uma espécie de híbrido de Terra com Marte, o que agora me faz lembrar do filme não kubrickeano Vingador do Futuro. Outro ingrediente era uma voz masculina plácida, grave e agradável, que, como um veterano narrador do Discovery Channel, explicava o que se via e acrescentava "dados confidenciais importantes", como o fato de a Terra ser um grão de areia em relação ao universo; a possibilidade de haver vida fora dela ser considerável; e a incapacidade da tecnologia do planeta impedir que esses seres conheçam a Terra e os humanos caso assim queiram. Depois, enquanto uma música eletrônica onírica e marcial surgia e se intensificava, a voz ficava repetindo esse mesmo tipo de informação com a mesma calma e naturalidade didática, mas usando palavras diferentes.
Acordei no susto. Não olhei que horas eram, mas o dia ainda não estava totalmente claro. Horário de verão desnorteia os desavisados. Na verdade, barulhos estranhos - pelo menos para aquela hora - chegavam do hall do andar até os meus ouvidos semiconscientes: passos pesados e rápidos, aparentemente de mais de uma pessoa. Achei que talvez estivessem assaltando o prédio, passando apressadamente por cada andar, e resolvi aceitar um novo convite ao sono e ignorar uma eventual batida na porta. Nem sempre é recomendável subestimar o inconsciente.