quinta-feira, 22 de dezembro de 2005
Pequenos votos de fartura e esperança
O abraço no porco-espinho certamente será aplicado e multiplicado nesse final.
O pneu do caminhão de mudanças corre o risco de furar nesse final.
A hora de retirar o gesso e as gazes pode ser agora, nesse final.
Lágrimas de vinagre e uma conspiração muda poderão se formar ou serem adiadas nesse final.
Enquanto isso, antes do começo encerrar de vez o final, pessoas espertas discutem papel higiênico.
E Deus continuará sendo um cachorro e um cristal.
terça-feira, 13 de dezembro de 2005
Apologia à rinite faz bem aos ouvidos
Bom, passaram batido por aqui quaisquer comentários sobre os maravilhosos shows do Claro Q É Rock no final do mês passado ou mesmo sobre a vinda do Pearl Jam. Estes últimos, embora tendo perdido, acompanhei passivamente o set list daqui de casa por morar perto do estádio. Pra consolar, vou recorrer ao velho e divertido post da trilha sonora dos últimos dias:
Swervedriver - "Mezcal Head" e "Raise". Baixei os dois primeiros discos dessa banda britânica, extremamente criativa durante os anos 90 e solenemente ignorada pela minha curiosidade até pouco tempo. Eu sabia mais ou menos do que se tratava e tinha preguiça: o rótulo shoegazer pra mim era quase sinônimo de autismo. Aliás, ainda é. Como há exceções que confirmam a regra, adoro My Bloody Valentine e agora estes cabeludos totalmente sem naipe. Gosto disso: bandas de gente com cara de 'normal', ou daquelas que você vê uma foto e não saca de cara o poder sônico. O Swervedriver batia cartão no Lado B da fase boa, quando um bando de zé-ninguéns de Oklahoma ou de Oxford eram despejados nos lares mais sortudos. O som é altamente estradeiro, tem muita pegada. Letras sobre mustangs e desertos. Vocal melódico e enterrado em milhares de detalhes de guitarras que, ao contrário das bandas 'próximas', te cativam e nunca entediam.
Social Distortion - "Somewhere Between Heaven And Hell". Sem palavras. Emocionante. E há anos que eu adiava a aquisição deste aqui. Uma definição simples e rasteira: o Mike Ness é um encontro do Joe Strummer com o Johnny Cash. Mas ainda prefiro o outro disco deles que tenho, o "White Light White Heat White Trash".
T. Rex - "Electric Warrior". Róque jurássico, afetação e diversão garantidas.
Detalhe: esses dois últimos eu comprei num sebo a preço de banana. Aliás, no final de semana passado tive o deleite de ler uma matéria na Revista da Folha com um percurso por alguns sebos daqui de SP. O prazer veio não só pelo meu insalubre hábito de fuçar os carcomidos estabelecimentos sempre que rola a equação [grana x paciência]², mas também por conhecer a maioria dos lugares listados e, principalmente, por estar familiarizado com esse prazer de encontrar um livro ou disco absurdamente barato, daqueles que o vendedor não tem a menor noção de quanto valeria numa dessas lojas virtuais gringas ou mesmo daqui. Aparecem direto cds ou livros usados com estado de novos, mas com preço de usados. Como viciado em música e sedento por pequenas descobertas inusitadas, já achei muita gente boa como Nine Inch Nails, Superdrag, Van Morrison e até a PJ Harvey dando mole. Também já tive umas desilusões, como ficar embasbacado ao achar dois cds clássicos do genial freejazzista Ornette Coleman por quinze pilas cada e, ao levar até o balcão, me deparar com um talho grotesco na mídia de cada um deles. O único efeito colateral preocupante disso tudo, além da maldita alergia, é o risco de se adquirir o senil costume de analisar longamente cada item pensando no custo-benefício. Mesmo que esse 'achado' seja um resumão de vestibular do José de Alencar ou um poster do Vanilla Ice.
Pra terminar, a dúvida: por que a redação da tal revista não investe mais nessa linha 'opções e roteiros insólitos em SP' e larga a mão de vomitar sempre como matéria de capa o catálogo da Dolce & Gabbana?!
sexta-feira, 9 de dezembro de 2005
Sessões no deserto
É aquela sensação estranha de acordar sem as suas roupas exclusivas de festa, num local ermo, com um velho apache observando de longe sem demonstrar qualquer expressão no olhar. É o veneno sendo entregue como amostra grátis na compra de três sacos de polvilho. É quando aquelas mesmas gralhas de antes enjoam de seus charutos e sujam todas as suas cuecas, passando a usar as mesmas do avesso. Pomada para queimaduras, só daqui uns dois mil metros adiante. Água é mais cara que o santo daime. Você acordou e te vestiram de pé-de-pano. Seu novo melhor amigo é um rotundo pobretão. Você cultiva um par respeitável de bigodes assimétricos e o espelho despenca posições na sua hierarquia pessoal de utensílios domésticos prioritários. Elimine o máximo de supérfluos possível e encontre o crânio enterrado: sua missão será desenferrujá-lo.